16 de jun. de 2015

Lugares "seguros".

O dia começa e ela se levanta sem acordar a menina que está na cama ao lado. A porta range um pouco ao abrir mas sucata faz esse som mesmo.

Do outro lado ela chega em um comodo com algumas caixas, alguns baldes com água, um pouco de luz do sol entrando pelas tábuas da janela.

Lava seu rosto e acende um fogareiro para aquecer um pouco de água. Puxa a blusa de um varal interior e tira a barra de ferro barulhenta estrategicamente colocada na porta. Do lado de fora da tenda, embaixo de um latão virado com a boca para baixo todo furado, um tímido tomateiro apresenta seus vermelhos e exuberantes frutos. 

Ela pega dois, não sem antes olhar bem a sua volta. 

O antigo barracão ao lado está vazio. As tendas do outro lado da rua estão silenciosos. Em cima do antigo metro suspenso, igualmente vazio. 

Talvez hoje seja um dia mais seguro.

Volta para dentro repassando mentalmente os lugares do dia anterior, tentando se lembrando de ter deixado algo para trás. Algo importante. Planeja voltar, mas depois de a menina acordar.

Tira uma faca de uma das caixas pequenas sob um cavalete e parte os tomates pela metade. Com um pouco de açúcar conseguido por pura sorte e um pouco de erva doce, na água fervente. Ela se delicia tomando um café da manha a muito sonhado.

Mas ainda precisavam de um almoço. Lembrou de ver alguns coelhos furtivos a noite, ali perto. Lembrou de um antigo mercado a quarenta quilômetros dali, numa rua muito escondida. Talvez tivesse sobrevivido algo lá.

Ao fundo ouvia água correndo. Lembrou dos machucados da menina. Pareciam feios e graves, precisava limpá-los. 

"oi" - disse a menina sonolenta.
"olá, está com fome?" - Perguntou ela estendendo uma metade de um tomate. 

A menina o pegou com voracidade e comeu bem rápido. 

"Está com sede?" - Perguntou oferecendo o chá.

A menina o tomou com cuidado. Estava delicioso. Mas uma dúvida não saía de sua cabeça de oito anos.

"Quem é você, moça?"

Nenhum comentário:

Postar um comentário